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  Conte sua históriaLucila Imoto Freitas › Minha história

Lucila Imoto Freitas

Campinas / SP - Brasil
53 anos, Secretária Executiva

Orgulho dos meus avós


Vou relatar as histórias dos meus avós. Fio-me nas memórias dos meus queridos pais e na minha própria.
Imoto Zengoro, meu avô paterno, era caçula de família abastada no Japão. Resolveu vir ao Brasil para não ser convocado para a guerra, um pouco antes da invasão japonesa a Manchúria. Antes de embarcar, ele fez o primeiro de muitos atos heróicos dos quais me orgulho imensamente de ser sua neta! Dias antes de embarcar, o melhor amigo do meu avô ficou doente e morreu, deixando a viúva e o único filho desamparados. Meu avô adotou o menino e assim, a esposa do falecido e seu filho puderam embarcar com meu avô. Meu avô já estava casado e tinha outros filhos. No Brasil, ele trabalhou em fazendas de café e teve que fugir à noite de uma delas. Ele chegou a possuir um negócio com bicho-da-seda no interior de São Paulo, em Gália. Mas quando descobriu que a seda estava sendo usada para a fabricação de pára-quedas dos Aliados na 2ª Guerra Mundial, ele pôs fogo no galpão. Ele, então montou uma loja de fotografias em Guaratinguetá, a FOTO IMOTO. Era um homem sem vícios, não fumava, não bebia, não gostava de jogos de azar. Era um homem justo e direito em seus princípios. Ele capinava um caminho vizinho à sua residência para facilitar a passagem de pessoas sem o risco de serem picadas por cobras. Teve 10 filhos com minha avozinha Fusako. Seu primogênito, morreu acidentalmente enquanto caçava. Meu avô e meus tios, já adultos, ajudaram a criar meus primos e minha tia que ficou viúva. Meus tios montaram várias filiais da FOTO IMOTO em Catanduva, Nhandeara e Taubaté. Atualmente, somente meu pai e uma tia estão vivos. Infelizmente, não conheci meu honrado avô. Ele faleceu, com 50 anos, de infecção urinária, 10 anos antes de meus pais se casarem. Minha batian criou sozinha todos os filhos (naturais e adotados), fazendo marmitas e, quando ficou idosa, morou com meu tio em Guaratinguetá. Alguns anos antes de morrer, aos 81 anos, ela quis para morar conosco e tive o privilégio de ter o carinho dela bem pertinho de mim.
Meu avô materno chamava-se Ichio Nito. Ele era filho ilegítimo no meu bisavô. Era fruto do relacionamento com uma gueixa. Foi obrigado a se casar com minha avó, que era empregada da família Nito para embarcar para o Brasil com a família do meu hiditian, fugindo da miséria que assolava o Japão em 1920. Enquanto ditian e batian trabalhavam na lavoura de cana-de-açúcar, a família Nito cuidava de um armazém em Jaboticabal e desfrutava dos lucros. Meus avós tiveram 11 filhos. Dois morreram bebês por amebíase. Minha mãe é a mais velha, seguida por mais 6 irmãs e 2 irmãos. Todas as filhas foram levadas para a cidade de Jaboticabal para trabalharem como serviçais da família. Bastava completar 5 anos de idade, minha bisavó muito “caridosamente” trazia-as do sítio para a cidade para aprenderem a ser empregadas domésticas. Meus avós trabalham na lavoura, sobrevivendo com uma quantia ínfima do lucro da família com a venda da cana e ainda compravam os mantimentos do próprio armazém da família. Quando meu bisavô morreu, minha bisavó e seus filhos venderam o armazém e a fazenda onde meus avós trabalhavam, dividiram a herança e foram para São Paulo. Logicamente, meu avô recebeu uma pequena parcela da herança da bondosa família. Meus pais trouxeram meus avós para morarem em Campinas, onde viveram por 20 anos no bairro Taquaral. Meus tios e tias foram para São Paulo onde vivem até hoje. Todos os finais de semana, nossa família e meus tios nos reuníamos na casa deles. Meus avós foram ao Japão, com o dinheiro da herança, para visitarem a província de Yamagata de onde imigraram, mas, infelizmente, todos que eles conheciam e que ficaram no Japão já eram falecidos. Os irmãos do meu avô dilapidaram o dinheiro que receberam de herança e hoje vivem na periferia de São Paulo em briga constante. Meu avô morreu há 3 anos, com 89 anos, vendo todas as filhas, filhos e netos estáveis em seus relacionamentos e financeiramente bem. Minha avó mora com uma tia minha em São Paulo e conheceu a bisneta, minha filha Gisele. Assim como meu avô paterno, o ditian Ichio aprendeu sozinho a ler e escrever em português e falava muito bem o idioma. A batian Kimie não fala português, pois sempre alimentou a esperança de voltar a morar no Japão. Infelizmente, o sonho dela não se realizou. Ela e o ditian sempre foram muito submissos e aceitaram seus destinos com resignação. Me orgulho deles também, pelo fato de terem sobrevivido às diversidades e nunca terem reclamado de nada.
Eu e meus irmãos somos frutos da perseverança, da honestidade, do caráter e da integridade dos nossos avós e nossos pais. Somos orgulhosos de sermos seus descendentes e procuramos transmitir aos nossos filhos todas as qualidades que herdamos.


Enviada em: 22/01/2008 | Última modificação: 22/01/2008
 
Quarta geração »

 

Comentários

  1. Daniel Paixão Fontes @ 31 Jan, 2008 : 14:17
    Você já havia comentado algumas partes desta história antes, mas completa ela é muito mais bonita e interessante do que eu pensava!

  2. Rita de Cássia Arruda @ 8 Abr, 2008 : 00:53
    Muito tocante a história de seus antepassados, Lucila. A fibra, a coragem, a dignidade e o exemplo de vida que deixaram para os filhos, netos e bisnetos certamente é digno de louvor. A Gigi é uma gracinha, sem dúvida !!! Bendita mistura de raças essa que resulta em uma criaturinha linda como sua filha. Parabéns e obrigada por dividir conosco suas histórias.

  3. Renato Yassuda @ 8 Abr, 2008 : 11:28
    Prezada Lucila; Parabéns por seus depoimentos e por compartilhar conosco. Muito bonita a história de sua família. Me recordei do estúdio de revelações Foto Imoto em Taubaté (sou natural desta cidade).Bom saber que era de seu avô. Muito bacana também o orgulho que você tem de sua filha. Meus filhos também são brasileiros com uma mistura de japoneses, portugueses, italianos, etc. ou seja; são brasileiros puros afinal este é o país em que as raças se fundem em um só povo. E que belo povo este o nosso. Um exemplo de aceitação e assimilação entre os povos do Mundo. Parabéns pela filha brasileira que trás em suas raizes os valores de seus ancestrais. Se puder leia meu relato neste site. Ficarei agradecido e honrado.

  4. Sigueru Oscar Matsuda @ 10 Abr, 2008 : 22:04
    Realmente, viva a miscigenação, os frutos geralmente são bonitos de se ver.A milha filha é uma mistura de Italianos, portugueses e japoneses. Parabéns.

  5. Silvio Sano @ 20 Mai, 2009 : 07:54
    Olá, Lucila. Parabéns por nos compartilhar de sua história ancestral e pela forma como expôs a miscigenação "em casa". A história dos seus ditians e batians, neste site, são também exemplares a pesquisadores, interessados e simpatizantes dessa história centenária da imigração japonesa no Brasil, pela variedade de passagens passadas por eles, até mesmo antes de virem para cá. E sua postura de reconhecimento das raízes que, com bom discernimento, já transmite à Gisele (logo mais ao Murilo) e intercambia, democraticamente, com as da família de seu marido, mostra que, no fundo, no fundo, somos uns privilegiados por vivermos em um país multirracial. Né, não? Abs.

  6. Lucila Imoto Freitas @ 8 Abr, 2010 : 12:21
    Boa tarde! Meu nome é Flávia de Oliveira Carvalho só entrei no site para procurar um pessoa que fez parte da minha juventude! Morei em Carajas (PA) e entre os anos 80 e 90 conheci um rapaz chamado Jun Moto (não tenho certeza do sobrenome dele!!). Nós o chamavamos dessa maneira. Ele foi estagiário da CVRD (VAle do Rio Doce). Dos pais dele só sei que o pai era japonês e a mãe brasileira, ele era muito alto de olhos verdes . Morava em Belem (PA). E a ultima notícia que tive dele é de que estava trabalhando como aviador. Em momentos vagos DJ's! Qualque notícia eu agradeceria muito a você. flaviacavalc@yahoo.com.br Busca: colônia japonesa de Belém no Pará

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