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Renato Siqueira

São Paulo / São Paulo - Brasil
45 anos, Jornalista

Você não vai entender porque não sabe japonês


Meu contato com a língua e cultura japonesa começou de uma forma bem diferente daquela dos descendentes que recebem uma dose de cultura vinda da própria família, e posso dizer que também é muito diferente dos aficcionados por artes marciais, religião ou culinária oriental. O meu interesse por cultura japonesa começou por causa de um jogo de videogame que anos depois tornou-se febre no mundo inteiro.
Dragon Ball Z Shin Butouden do Super Famicom foi lançado em 1993 e nessa época eu tinha apenas 13 anos, e como todo o garoto daquela época era viciado em videogame. Nas férias eu sempre jogava durante muitas horas todos os dias e sempre me encontrava com a galera de uma locadora chamada Only Games cujo dono era Nikkei. Um dia eu estava olhando dois garotos jogarem um game dentro da locadora. Eu só me lembro de ver os personagens lutando e soltando raios pelas mãos. A pancadaria comia solta e aquilo me fascinou. Implorei pro dono da locadora me deixar levar o jogo para casa. Joguei bastante, mas não sabia nada sobre os personagens e nem sobre a história porque tudo estava em japonês. Os lutadores gritavam palavras que eu não entendia, mas aquela ação eu nunca tinha visto na minha vida. Quando fui devolver o game na locadora, o dono que era meu amigo me disse:"Olha, esse game é de um desenho animado japonês que não existe no Brasil. Você só pode assistí-lo se conseguir alugar as fitas em locadoras japonesas". Ele ainda me contou que havia uma locadora dentro de um prédio na avenida paulista em São Paulo chamado Top Center que coincidentemente era o mesmo lugar onde minha mãe costumava cortar os cabelos.
Um dia eu fui com ela até o Top Center e encontrei a locadora de japonesa. Enquanto minha mãe estava no salão eu entrei na loja e todas as pessoas espantadas olhavam para mim em silêncio. Talvez eu fosse um dos poucos brasileiros que entrou naquela locadora. Eu não sabia ler japonês, mas encontrei as fitas de Dragon Ball Z por causa da letra "Z" escrita em alfabeto romano. Peguei uma das fitas na mão e levei até um videocassete e uma tv que havia lá dentro. Quando ia inserir a fita, a atendente da loja me chamou:"Ei, o que você está fazendo? Você não pode mexer aí! É apenas para clientes!"
Eu pedi para que ela me deixasse ver só um pouco. E depois disso ela colocou a fita no vídeo. Eu só me lembro de uma cena. Era uma luta entre dois personagens. Um deles subia para o céu com o impacto de um soco e de repente lá em cima estava novamente o oponente para acertar-lhe outro golpe tão forte que, com o impacto, o fez entrar bem fundo no solo. Aquilo me fascinou de tal maneira que eu disse para a atendente que queria levar aquela fita. E claro que ela recusou. Me disse que aquela locadora só entravam os descendentes de japoneses e amigos indicados por estes descendentes. Eu fiquei triste e a minha reação foi voltar até o salão de cabeleireiro e contar tudo para a minha mãe. Depois de ouvir toda a minha história ela foi até a locadora pegou uma das fitas com "Z" e disse:"Eu quero levar essa fita aqui para o meu filho" e a atendente disse para ela que não poderia e completou:"O seu filho não é japonês! Ele não vai entender isso aqui!" Depois disso as duas começaram a discutir, mas eu só me lembro da minha mãe responder: "Mesmo que ele não entenda, qual é o problema de se interessar por algo diferente? E por quê você tem preconceito contra brasileiros? Eu posso processar essa locadora!"
Depois disso a atendente fez a minha ficha na locadora e lá eu fiquei alugando filmes por seis anos. Assisti a todas as sagas de Dragon Ball antes das pessoas começarem a se interessar pelos animes. Foi durante esse período em que alugava fitas que comecei a querer aprender a língua japonesa, que conheci o Taikô, os samurais, o ikebana, Ryokucha, Akutagawa Ryunosuke, Eiji Yoshikawa, Matsumoto Kyoshi (rs), o Sushi e o sashimi, o Chado, etc.
Além disso, eu tinha um sonho de trabalhar em uma revista de games (já que jogava tanto, né!). Eu consegui isso em 1999 sendo freelancer da Revista Gamers da Editora Escala e em 2000 fui trabalhar na Conrad Editora com a Nintendo World e Pokémon Club. Dentro da Conrad eu ajudei a fazer a nova revista Herói, editei os mangás de Dragon Ball e escrevi praticamente todos os livros, revistas, adesivos, cards e materiais especiais sobre Dragon Ball já lançados no Brasil. Foi trabalho pra caramba. Através da editora eu me apaixonei por cinema, fiz uma centena de entrevistas, fiz a cobertura de eventos e escrevi milhares de textos. O meu interesse pela cultura japonesa foi se ampliando cada vez mais.
Em 2003 eu tive o prazer de conhecer o cantor dos temas do anime e dos games de Dragon Ball Z, Hironobu Kageyama por causa de um amigo que era tão louco por ele quanto eu.
Hironobu Kageyama veio ao Brasil para fazer um show e quando cantou We got a Power (segundo tema do anime DBZ) eu não aguentei e chorei atrás do palco. Inacreditável conversar com aquela pessoa tão amável e que eu havia admirado por tantos anos. Nós nos tornamos amigos.
Em 2007 eu voltei ao prédio do Top Center. Desta vez fui até lá para buscar meu visto, estava com viagem marcada para o Japão. Juntei muito dinheiro e tive a ajuda de muitos amigos e da minha família. Lá no Japão eu reencontrei com o Kageyama. Quando estava conseguindo me expressar melhor em japonês eu disse a ele: "Por sua causa eu aprendi japonês, e agora por sua causa eu vim até aqui" e ele caiu na gargalhada.
É incrível que no final de 2008 eu serei mais um dos poucos graduados em Letras - Língua, Cultura e Literatura Japonesa pela Universidade de São Paulo que não é descendente de japoneses. Hoje é o amor pela língua, pela cultura e pelas pessoas deste país tão distante que me fazem querer estudar e me dedicar cada vez mais.

Para saber mais sobre a minha viagem, pode dar uma olhada no meu fotolog (http://www.fotolog.com/penpas)


Enviada em: 03/01/2008 | Última modificação: 24/01/2008
 

 

Comentários

  1. paloma @ 6 Jan, 2008 : 06:43
    oi Renato, parabens! eu, nissei, vim ao japão sem saber falar nem dez palavras em nihongo, e sei como é dificil esse idioma, por isso estou enviando essa msg para vc. Omedetou!!!

  2. Yassuda Renato @ 22 Jan, 2008 : 17:59
    Prezado Renato; À parte o fato de sermos homonimos (ambos Renato), compartilho com você o interesse por assuntos da cultura japonesa, notadamente filmes sobre samurais. Também aprendi muito assistindo a filmes. Quanto ao conhecimento seu, me parece ser maior que muitos descendentes de japoneses que conheço. Infelizmente a atendente da videolocadora que você citou em seu relato não teve o devido bom senso... Parabéns e sucesso em sua caminhada.

  3. Érica Kanashiro @ 4 Mar, 2008 : 16:42
    ^_^ É inspirador ver uma pessoa como você que, mesmo de forma inusitada, quando tem contato com algo novo prossegue com determinação. Conheço somente o lado mais pop e falado da cultura japonesa. Vendo assim até sinto vergonha de ser uma descendente tão desleixada... >_<

  4. 留学生 @ 14 Mar, 2008 : 00:56
    Ola, Renato. Se quando voce tinha 13 anos, os nikkeis em Sao Paulo falavam japones tao bem a ponto de terem uma locadora com titulos so em japones, estou realmente impressionado com o quanto eles mudaram. Em tempo, parabens a sua mae pela iniciativa se fazer valer seus direitos.

  5. Amanda @ 8 Mai, 2008 : 21:28
    Que ótimo! Parabéns! Também me interesso muito nisso! Comecei a ver animês com apenas 6 anos de idade os primeiros que eu vi foram Pokémon, Digimon e Sakura Card Captors, hoje tenho 13 anos, e faz pouco tempo que descobri o que são animes. Amo muito isso, já sei um pouco de japones, e pretendo ir ao Japão o mais rápido possivel, fazer um intercâmbio! Parabéns mesmo!

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